1 de ago. de 2013

Mecenas Fashion

Marcas de luxo italianas encabeçam projeto para restaurar monumentos históricos no País
Por Priscilla Sobral e João Fantini


Mesmo durante a reforma patrocinada pela Tod´s, o Coliseu
deve se manter aberto a visitação (Reprodução)
Arte e moda andam lado a lado. Desculpe-nos pelo clichê, mas, como todas as frases escritas e repetidas a exaustão, ela tem seu fundo de verdade quase universal. E o quase, nesse caso, aplica-se a perfeição a um país que se tornou exceção tanto no quesito museus como na qualidade e quantidade de lojas enfileiradas rua acima. Benvenuti in Italia. 

Terra fértil dos gênios artísticos desde a antiguidade, a "bota" reúne em seu diminuto território patrimônios da humanidade como o Coliseu, a Torre de Pisa, a Catedral de Florença e o Duomo de Milão. No total, são 47 deles reconhecidos pela Unesco, o maior número em um único País. Joias da arquitetura nacional, eles inquestionavelmente inspiraram o estilo das mais importantes casas de moda mundiais. Para iniciar, listemos Gucci, Salvatore Ferragamo, Versace, Dolce & Gabbana, Prada, Fendi e Tod´s.


A reforma da Fontana Di Trevi, em Roma, será supervisionada
artisticamente pelo diretor criativo da Fendi, Karl Lagerfel (Reprodução)
Para as duas últimas, contudo, a coisa toda vai além do mérito inspiracional. No início deste ano, ambas as grifes anunciaram o patrocínio da restauração de símbolos históricos italianos. A Tod´s ficou responsável pelo Coliseu, enquanto a Fendi escolheu a Fontana Di Trevi, em uma iniciativa que batizou de "Fendi For Fountains". 

Eternizada no filme "La Dolce Vita", de Federico Fellini, no qual a atriz sueca Anita Ekberg toma um banho na fonte, a Fontana Di Trevi foi criada por Nicola Salvi e tem sua construção datada de 1732. Destino de milhões de turistas todos os anos, a construção passa por problemas estruturais, especialmente devido a falta de recursos do governo para investimentos: sua última restauração aconteceu há 20 anos e em 2012 partes da estrutura da fonte caíram. 

A Bulgari patrocinou a reforma da Ponte dos Suspiros,
em Veneza, e durante dois anos
exibiu um outdoor no local (Reprodução)
No acordo firmado com a Fendi, a reforma - prevista para terminar em 2015 - terá um custo estimado em R$ 6,3 milhões. Isso inclui a completa restauração do monumento, a limpeza de suas estátuas de mármore travertino e a troca de inscrições em latim. Em nenhum momento, contudo, a fonte será fechada ao público, já que o processo de restauro cumprirá três etapas. "Sem iniciativas deste tipo, não conseguiríamos preservar a memória cultural do nosso país”, disse o prefeito de Roma, Gianni Alemanno. 

Em contrapartida, a label terá a Fontana Di Trevi como cenário do do desfile que comemora seus 90 anos, além de uma placa de agradecimento instalada no local por três anos e espaços publicitários nos tapumes usados durante o restauro. 

A Tod´s, por sua vez, será a responsável pela maior reforma de monumentos históricos italianos financiada pela iniciativa privada. Serão cerca de R$ 57 milhões de reais investidos ao longo de dois anos e meio na reforma do Coliseu. Datada de 80 A. C, a arena tem sua estrutura afetada pela poluição e por uma linha de metrô que circula nas proximidades. "Um monumento que representa a Itália no mundo precisa ser restaurado e uma empresa que representa o produto italiano internacionalmente diz que "se você precisa de nós, estamos aqui", disse Diego Della Valle, fundador da marca. 

A Diesel investirá cerca de 5,5 milhões de euros
para restaurar a Ponte Rialto, em Veneza (Reprodução)
Assim como na Fontana, o Coliseu deve ficar aberto para visitação durante todo o período de reforma e não receberá qualquer tipo de propaganda relativa a Tod´s quando pronto. "Não colocaria sapatos Tod no Coliseu", disse Della Valle. Porém, uma parte relativa à venda de ingressos para a entrada no espaço será explorada pela sua patrocinadora. 

Investimento polêmico
A ideia de unir o "útil ao agradável", contudo, não surgiu assim tão recentemente e seu caminho não foi sempre fácil. No fim de 2011, a Bvlgari entregou a versão restaurada da Ponte dos Suspiros, a mais famosa de Veneza. Durante os dois anos, a joalheria - que investiu 2,8 milhões de euros na restauração - cobriu parte da estrutura em reforma com um enorme outdoor de propaganda. Criticada por violar o que é considerado patrimônio da humanidade, a Bvlgari argumentou que nem o governo e nem o povo da cidade teriam condições de assumir os custos da obra. O risco, então, seria de ver a ponte se deteriorar sobre o canal. 
Construída em 1732, a Fontana Di Trevi foi eternizada
em cena do filme La Dolce Vita, de Federico Fellini (Reprodução)
Outro receio apontado pela Associação de Restauradores da Itália no caso desse tipo de ação é a mão de obra contratada pelas marcas. Por não ser especializada nesse tipo de trabalho, as equipes poderiam desconfigurar estruturas importantes dos monumentos. As grandes casas de moda italianas - especialmente as comandadas por famílias, como é o caso da Tod´s, da Fendi e também da Prada, esta última responsável pelo restauro do Palazzo Ca’Corner Della Regina, atualmente seu instituto cultural - parecem não ter essa preocupação. Enquanto investem no terceiro setor em sua expansão para os países em desenvolvimento, nas terras de origem mantêm os olhos voltados para a arte. 

De todos os milhões investidos, com ou sem propaganda, a lição que fica para os países que observam de fora é uma só: para que se mantenha a glamurosa aura em torno das marcas mais cobiçadas do planeta, não basta apenas investir em campanhas, modelos e produção artesanal. Quem investe em itens que trazem em suas etiquetas cifras milionárias saiu da bolha e não espera das grifes nada diferente de investimentos que tragam um retorno que vá além da herança fashion. Brasil, fica a dica.

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